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quinta-feira, 3 julho, 2025 12:56: am
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A meio mundo de distância, a OTAN ajuda o Japão a ganhar força na Ásia

Com uma Constituição pacifista, Tóquio não pode ir para a guerra, mas não quer ficar fora do jogo em termos de capacidades militares. As missões contra a pirataria são uma forma de se afirmar.

O mundo está mudando, e há novas potências emergindo na Ásia. É quase uma banalidade dizer isto, mas para o Japão, esta é a sua realidade geográfica. “Neste momento, uma em cada três pessoas na população mundial é chinesa ou indiana, e estes são países em ascensão”, diz Masafumi Ishii, o representante de Tóquio na OTAN. O desafio para o Japão, é impor o papel que escolheu para si, que é o de uma espécie de irmão mais velho e mais sábio.

“Não é de espantar que as relações internacionais estejam num processo de ajustamento”, afirmou Ishii, que falou com o PÚBLICO na semana passada, numa passagem por Lisboa, para explicar de que forma a parceria com a Aliança Atlântica está ajudando o Japão a ancorar-se melhor no Pacífico.

“A OTAN é a marca com mais sucesso internacional em termos de segurança, e também a força mais capaz de estabilização. Faz sentido para o Japão aprender com a Aliança Atlântica, como organizam as suas forças militares, como as operam. Fazemos isso participando em treinos e exercícios conjuntos com a OTAN, em que aumentamos o nosso nível de interoperabilidade”, explicou.

Este aumento de intimidade do Japão com a OTAN tem a ver com a posição que Tóquio se vê assumir na Ásia, o continente em mudança: “Alguém tem de se esforçar para manter a estabilidade”, diz o embaixador Ishii. Esse papel de irmão mais velho, de um ator regional “que possa avançar para garantir a segurança ou evitar uma crise”, é o papel que o Japão gosta de atribuir a si próprio. “Num olhar global, podemos dizer que há apenas três pilares dispostos a assumir esta posição: os Estados Unidos, a Europa, e as democracias da Ásia, Japão, República da Coreia e Austrália.”

O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, terá um palco privilegiado para apresentar a visão geopolítica do Japão esta semana, quando discursar, pela primeira vez, numa sessão conjunta do Congresso norte-americano, dia 29 de Abril. Em causa está não só a sua posição no tabuleiro regional como a relação nipônica com os EUA.

É a China a maior ameaça que Tóquio pressente na sua região, ou é dela que quer tentar ser esse irmão mais velho? “A China pode não ser o único problema – a Coreia do Norte é uma questão mais séria e mais urgente”, afirma o diplomata. “A China é um desafio. Temos de coexistir com ela, é o que o Japão tem feito nos últimos dois mil anos. Coexistimos e prosperamos juntos, é o que queremos fazer. Claro que temos de nos preparar para o pior, mas na esperança de que este momento nunca chegue.”

A disputa territorial em torno do arquipélago Senkaku – ilhas desabitadas administradas pelo Japão desde 1895, mas que a China também reclama – é o motivo de confronto mais recente. “Mas as relações começaram a voltar ao normal, e isso é bom. O Presidente Xi Jinping e o primeiro-ministro Shinzo Abe encontraram-se em Novembro (e de novo a 21 de Abril, na Indonésia), e isso é bom. É bom que a China tenha aceitado sentar-se à mesa para discutir a criação de um mecanismo de solução de crises, finalmente. Embora no terreno a cada dez dias, duas semanas, continuem a haver três passes territoriais de navios”, diz o também embaixador nipônico em Bruxelas.

À volta do artigo 9.º
Não é de agora a aliança do Japão com o Tratado do Atlântico Norte, embora tenham meio mundo a separá-los: a parceria fez já 35 anos este ano. Mas com o primeiro-ministro Shinzo Abe, o desejo de afirmação nacional ganhou novo fôlego – e também a vontade de descartar, ou pelo menos aliviar, a formulação do artigo 9.º da Constituição, que afirma que o Japão “renuncia à guerra como um direito soberano da nação e à ameaça ou uso da força como um meio de resolver disputas internacionais”, bem como ao direito de manter uma força com capacidade de combate.

Este artigo é uma herança da II Guerra Mundial, na qual o Japão foi derrotado militarmente e também castigado com duas bombas atómicas pelos Estados Unidos, as primeiras – e até agora únicas – armas nucleares utilizadas num cenário de guerra. Em troca de ceder o direito a fazer guerra, os Estados Unidos assinaram um tratado com o Japão, em que se comprometem a assegurar a defesa do país, se alguma vez for atacado.

A vontade de mudar este status quo do pós-II Guerra não é nova, mas o abandono da Constituição pacifista é um assunto muito polêmico, embora o Japão tenha constituído algo semelhante a um exército: as forças de autodefesa do Japão, muito bem equipadas. Mas não têm um mandato ofensivo, ao contrário de um exército de outros países.

publico.pt

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