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Dorothy Stang pela preservação e reforma agrária

Dorothy Stang, a 74-year-old American nun, was shot to death early February 12, 2005 in Brazil's Amazon rain forest where she worked to defend human rights and the environment despite frequent death threats, federal police said. Unknown assailants shot U.S. missionary, Dorothy Stang at point-blank range at an isolated agricultural settlement in dense jungle 31 miles from the town of Anapu in the state of Para, police and fellow religious workers said. A February 12, 2004 file photo shows Missionary sister Dorothy Stang in Belem, northern Brazil. (BRAZIL OUT) REUTERS/Imapress/AE/Carlos Silva

A luta pela reforma agrária e pela preservação do meio ambiente foi a bandeira que guiou a vida da missionária Dorothy Stang. Nascida em 1931 nos Estados Unidos e naturalizada brasileira, ela morreu sem abrir mão de suas convicções sobre o direito à terra.

Assassinada a tiros no dia 12 de fevereiro de 2005, Dorothy atuou por mais de quatro décadas no Brasil e deu alguns passos para realizar o sonho de ver trabalhadores rurais retirando o sustento de suas próprias terras e convivendo em harmonia com a Floresta Amazônica.

A Agência Brasil visitou Anapu, no sudoeste do Pará, onde a freira trabalhou por cerca de 20 anos na luta pela implantação do primeiro Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) do Brasil. Pioneiro na forma com que promovia a subsistência e a exploração sustentável da floresta, o projeto ganhou o nome de Esperança para ilustrar o desejo dos trabalhadores que chegavam ao município em busca de uma vida nova e de um território onde pudessem criar sua família.

No local, a histórica tensão envolvendo conflitos fundiários, que aumentava constantemente com a expansão do comércio ilegal de madeiras, atinge o seu ápice no início dos anos 2000, em grande parte devido à ausência do Estado, e se estabiliza momentaneamente logo após o assassinato.

Nos testemunhos ouvidos pela reportagem foi possível confirmar que o caso de Dorothy, apesar da grande repercussão, inclusive internacional, não é uma exceção na história de disputas por terra no país, protagonizados por poderosos de um lado e pessoas simples de outro.

A frase “Irmã Dorothy Vive!” estampa camisetas usadas por aqueles que conviveram com a missionária. “O sangue de Dorothy lava a terra”, anuncia um cartaz que pede reforma agrária. Para o bispo dom Erwin Krautler, que recebeu a missionária em 1982, quando ela chegou à região do Xingu, “reforma agrária não é só cortar lotes de terra e distribuí-los a famílias carentes”. “É fixar o homem e a mulher na terra, fazer com que encontrem na terra a sua vida e a vida de seus filhos e netos”, resume.

Foi dele a sugestão para que Dorothy Stang atuasse no Pará em uma região onde havia “gente paupérrima” porque ela queria trabalhar entre os “pobres mais pobres”.

O estado que contabiliza a morte da missionária é também o líder no ranking de mortes por conflitos no campo. Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), 645 pessoas foram assassinadas no Pará de 1985 a 2013 – o que representa 38% do total de 1.680 homicídios por disputa de terra registrados nesse período.

O alto número de mortes, entretanto, não é proporcional ao de condenações por episódios de violência no campo o que gera uma sensação de impunidade entre vários setores da sociedade civil. Nos últimos 30 anos, 1.270 casos de morte por disputa de terra foram registrados pela CPT. Apenas 28 mandantes foram condenados e 13 foram absolvidos no mesmo período. Entre os executores, 86 foram responsabilizados pela Justiça e 58, absolvidos.

Atualmente, o PDS Esperança abriga 261 famílias de pequenos agricultores que ainda pedem mais presença do Poder Público. Apesar de as condições de vida terem melhorado na última década, muitos dostrabalhadores rurais vivem um cenário de instabilidade gerado por longos processos na Justiça sobre a posse da terra e a pressão de madeireiros que têm interesse em extrair árvores nativas de modo desenfreado.

Depois da implantação do PDS Esperança, em 2004, o Brasil avançou na formalização de estruturas que seguem a lógica do desenvolvimento sustentável e, hoje, contabiliza 129 projetos implantados. De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), esses assentamentos abrigam 25 mil famílias.

Reportagem: Paulo Victor Chagas | Edição: Lílian Beraldo | Fotos: Tomaz Silva | Desenvolvimento: Pedro Ivo de Oliveira

Há dois anos no PDS Esperança, o mesmo projeto que a missionária Dorothy Stang lutou para implantar, a camponesa Luzinete Sales, 41 anos, complementa a renda da plantação de cacau feita pelo marido, Robson Silva, com a produção de bonecas para enfeite e sorvete. “No início, faltavam algumas coisas, mas agora já melhorou bastante. Não passamos necessidade. Às vezes não tem carne, mas aí tem um vizinho que traz um pedacinho”, conta a artesã sobre a vida na comunidade.

“Eu acredito que [daqui] uns dois anos vai estar melhor. Todo mundo já vai ter produzido mais. Valeu a pena o esforço [de Dorothy Stang]. Tivemos o direito a um pedaço de terra. É só arregaçar as mangas que as coisas melhoram”, garante.

O agricultor Edilson do Nascimento, 39 anos, mora há dez em um terreno às margens do PDS Esperança e aguarda uma decisão da Justiça sobre a posse do lote que ocupa. Um grande fazendeiro da região se diz dono da terra que também é pleiteada pela União. Mesmo com o cenário de indefinição e instabilidade, ele conta que não se arrepende de ter ido para a região à procura de um lugar para tirar o sustento.

“Eu vim atrás da terra para sobreviver e acho que, para mim, foi uma coisa muito boa. Se eu não tivesse vindo para cá, eu estava como uma pedra, rolando para lá e para cá, sem criar lodo”, relata o trabalhador que mora com a mulher e três filhos.

A convivência com as freiras da Congregação Notre Dame de Namur rendeu a Ivonilde Santos Sousa, 48 anos, o apelido de Irmãzona. Ela conta que, no início dos anos 2000, pessoas contrárias à implantação do PDS diziam que a região não se desenvolveria. “O pessoal dizia que a gente ia comer casca de pau, que não ia ter nada. E hoje a maioria das coisas que sai para o município de Anapu é daqui de dentro.”

Defensora do modelo sustentável adotado pelos assentados, ela reivindica mais auxílio do Estado para consolidar o trabalho desenvolvido no local. “Eu gostaria que o governo olhasse mais para nós e visse a nossa situação aqui, a nossa luta, nossa batalha. A gente vive tentando levar esse assentamento nas costas do modo que ela [Dorothy] queria, que os agricultores tivessem direito à terra e condições de trabalho.”

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